No filme, que em pontos ocasionais se destaca do livro, conhecemos a história de Augusten Burroughrs (interpretado aqui por Joseph Cross), um jovem filho de uma mulher perturbada que sonha ser um dia uma poetisa reconhecida e que, a dada altura, opta por deixar o filho, então com 12 anos, na estranha casa da família de Dr. Finch, o seu psiquiatra. Num pequeno mundo, no qual é difícil perceber se há sãos entre tantos loucos (a começar pelo médico), Augusten vive a sua adolescência. Infeliz. E regista, num diário, as situações pelas quais passa nessa excêntrica mansão na qual a árvore de Natal fica montada o ano inteiro e não faltam comprimidos para males da alma e onde encontra um novo conceito de família e um novo modo de vida, que cedo o leva a rejeitar a escola. É também aí que ocorre o despertar da sua sexualidade, numa relação com um homem mais velho que, como em tudo entre os Finch, se revela longe de seguir os caminhos mais esperados... Cortante paródia ao protagonismo do “psicologês” nas vidas contemporâneas, Recortes da Minha Vida cruza as linguagens da comédia com uma narrativa central dramática, o bizarro e o insólito deixando-nos frequentemente perdidos entre a gargalhada e mais um pólo de séria reflexão. Como explica depois o realizador num dos extras, esta é uma história onde não há bons nem maus. Todas as personagens têm um pouco dos dois extremos, instáveis, surpreendentes por vezes. Tão reais que parecem de ficção... De certa forma próximo de outros retratos, fragmentados, da vida comum que, nos últimos anos, encontrámos em filmes como Beleza Americana (Sam Mendes, 1999) ou Happy Endings (Don Roos, 2006), Recortes da Minha Vida é filme a resgatar, quanto antes, ao anonimato a que parece votado. – N.G.
A edição nacional, em DVD, de Recortes da Minha Vida, de Ryan Murphy, assegurada pela Sony Pictures, junta ao filme uma série de conteúdos adicionais. Ao todo, a oferta de extras propõe três documentários distintos. Escutamos, num primeiro, opiniões dos actores e do próprio realizador sobre o filme, as suas personagens e história que nos contam. Num segundo, o próprio Augusten Burroughs, um dos co-produtores de Recortes da Minha Vida, coloca na primeira pessoa a relação do seu passado com o que o filme mostra. Histórias de uma infância da qual, diz, fugiu anos a fio, mas que o moldaram como homem. A terminar, um olhar sobre a forma como foi construído o cenário da casa dos Finch, elemento central a toda a história.